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Tecendo a Escritura

Olá, Nosso Blog é uma janela de acesso aos textos escritos no Laboratório de Criação Literária, in-disciplina desgovernada pelo Cid, professor da Universidade Federal do Ceará. Boa leitura!

O Beijo

             Concordou com os três. Primeiro porque se dizia namorada de um e queria provar o gosto – pela primeira vez – do beijo dele. Segundo porque era puta.
            - Eu te quero muito. Ofereci uma música pra ti na rádio.
            - ...
            - O menino besta. Quê que tem?!
            Tentava agradar, mas não conseguia disfarçar a cara lasciva de desejo. Acertavam o local, tinha que ser onde ninguém pudesse os ver, onde ninguém pudesse pressentir a presença deles. E tudo fora ajustado perfeitamente, quase uma estratégia de guerra, mas não haveria perdas. E ela louca pra que alguém visse, mas só quando estivesse com o “namorado”, queria provar aos outros, mais que a si mesma, pois realmente gostava loucamente dele, todavia, sabiam da alcunha dela, e era difícil lavar a honra com um “namorado” com dois amantes de brinde.
            - No campo então! De sete horas viu!?
            O “namorado”, o mais tranqüilo, talvez porque soubesse que com ele seria fácil, os outros dois que se arranjassem na hora, ele já conseguira convencer ela pra que aceitasse os três, e ela só aceitou porque fora ele que pedira.
            - Mas vamos fazer o seguinte. Primeiro vai o ***. Depois vais tu e por fim eu. Assim ela vai ter que fazer com vocês até chegar a minha vez. Dizia isso sentindo-se um campeão, um estrategista perfeito. Não haverá perdas! E tentava controlar a risada, ninguém podia saber que eles ali estavam.
            Ela já chegou abraçando o “namorado”. Tentou trocar algumas palavras, mas foi prontamente repreendida antes que cantasse a música que havia oferecido. Respirou desoladamente, pois já havia enchido os pulmões para cantar. Só restou cerrar os olhos, consumindo-se de lágrimas, e deixar o ar escapar. Mas provar o beijo dele era mais violento. Necessitava que ele fosse dela apenas uma vez. Não necessitava mais comprovar nada pra ninguém, era só estar perto dele, provar do beijo. Quis encostar-se, olhar-lhe mais próximo, inventava formas de protelar o início da estrada que haveria de trilhar até chagar e dedicar-se a ele.  Tomar posse do abraço, memorizar-lhe o cheiro, o calor dos braços, o peso dos ombros. Ouriçava-se só em pensar na barbinha rala beijando sua nuca. Devorava-se por dentro, nem se lembrava dos outros, que fizessem! Seriam esquecidos na hora, procuraria relembrar cada detalhe do “namorado” quando estivesse esquecendo-se nos outros. Os olhos esverdeados de bandido, os lábios finos, os cabelos escuros; queria com as mãos percorrer-lhe a cabeça, apoiá-las em sua nuca. Encaixar suas pernas nas dele, e deixar-se consumir. Mas o beijo... O beijo era o que mais importava. O beijo seria a redenção de todas as mentiras que até ali ousara empreender. O beijo do “namorado”, que ela sentia-se loucamente apaixonada. Faria um labirinto de seus lábios, molhados, lentamente sobrepondo o lábio no dele, movimentando firmemente de um lado para o outro, demorando em sentir os doces movimentos que ele saberia, conduzindo vagarosamente a língua até a boca dele, ele retribuindo, até que as duas se prendessem em constantes diálogos... Perdia-se nisso tudo, que nem percebeu que o primeiro já terminara.
            O segundo vinha inquieto, mas cretino. Ela o olhou com os olhos tão inocentes que ele percebeu e quis sentir-se culpado de algo, mas não sabia o quê.
            - Fica de costas vai!
            E ela fechou novamente os olhos e toda a espera voltava a sua mente. Mas o segundo, sujo e mais cretino, dizia-lhe obscenidades que lhe atrapalhou os sonhos. E sentiu um estremecimento que a fez gemer. Ele riu, ela acompanhou sem saber o porquê. Tentava concentrar-se em algo diverso mas uma angústia de tempo e prazer e não acreditava na vida real e era tudo como antes e uma angústia de gozo cerrando os dentes cravando as unhas e sentia escorrer um mel em sua boca uma angústia maldita e geral feia ou alegre prendendo o grito e o hálito quente... ah! Quase chorou, mas desfeita a farsa, calou na alma o prazer.
            E chegou a vez dele. Tão meigos os seus olhos que ela nem desconfiou. Os olhos concentravam-se profundamente. E ela procurava o beijo, e ele escapava. Ela avançava a boca, ele virava o rosto, tentou segurar-lhe o queixo, ele baixou a cabeça. E tentava salvar a espera como um soldado com esperanças na vitória, e cada movimento dele era uma estocada, um tiro queimando, a boca escondia-se, o rosto opunha-se ao dela, ela avançava os lábios, ele olhava pro céu, e tentava e tentava desesperadamente e nenhuma resposta aos seus abalos. E ele firme, ereto, sem entradas, estúpido, e a coitada já não sonhava mais, tentava realizar tudo, mas tudo fugia das mãos, tão próximo, só para ferir intensamente. Até que seus lábios encontraram-se. Ele arfando em pleno gozo, esqueceu a boca como esqueceu quem ela era. E ela timidamente tentou um movimento. Antes que ele respondesse... ela abriu tristemente os olhos...




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                Tentava agradar, mas não conseguia disfarçar a cara lasciva de desejo. Acertavam o local, tinha que ser onde ninguém pudesse os ver, onde ninguém pudesse pressentir a presença deles. E tudo fora ajustado perfeitamente, quase uma estratégia de guerra, mas não haveria perdas. E ela louca pra que alguém visse, mas só quando estivesse com o “namorado”, queria provar aos outros, mais que a si mesma, pois realmente gostava loucamente dele, todavia, sabiam da alcunha dela, e era difícil lavar a honra com um “namorado” com dois amantes de brinde.
                - No campo então! De sete horas viu!?
                O “namorado”, o mais tranqüilo, talvez porque soubesse que com ele seria fácil, os outros dois que se arranjassem na hora, ele já conseguira convencer ela pra que aceitasse os três, e ela só aceitou porque fora ele que pedira.
                - Mas vamos fazer o seguinte. Primeiro vai o ***. Depois vais tu e por fim eu. Assim ela vai ter que fazer com vocês até chegar a minha vez. Dizia isso sentindo-se um campeão, um estrategista perfeito. Não haverá perdas! E tentava controlar a risada, ninguém podia saber que eles ali estavam.
                Ela já chegou abraçando o “namorado”. Tentou trocar algumas palavras, mas foi prontamente repreendida antes que cantasse a música que havia oferecido. Respirou desoladamente, pois já havia enchido os pulmões para cantar. Só restou cerrar os olhos, consumindo-se de lágrimas, e deixar o ar escapar. Mas provar o beijo dele era mais violento. Necessitava que ele fosse dela apenas uma vez. Não necessitava mais comprovar nada pra ninguém, era só estar perto dele, provar do beijo. Quis encostar-se, olhar-lhe mais próximo, inventava formas de protelar o início da estrada que haveria de trilhar até chagar e dedicar-se a ele.  Tomar posse do abraço, memorizar-lhe o cheiro, o calor dos braços, o peso dos ombros. Ouriçava-se só em pensar na barbinha rala beijando sua nuca. Devorava-se por dentro, nem se lembrava dos outros, que fizessem! Seriam esquecidos na hora, procuraria relembrar cada detalhe do “namorado” quando estivesse esquecendo-se nos outros. Os olhos esverdeados de bandido, os lábios finos, os cabelos escuros; queria com as mãos percorrer-lhe a cabeça, apoiá-las em sua nuca. Encaixar suas pernas nas dele, e deixar-se consumir. Mas o beijo... O beijo era o que mais importava. O beijo seria a redenção de todas as mentiras que até ali ousara empreender. O beijo do “namorado”, que ela sentia-se loucamente apaixonada. Faria um labirinto de seus lábios, molhados, lentamente sobrepondo o lábio no dele, movimentando firmemente de um lado para o outro, demorando em sentir os doces movimentos que ele saberia, conduzindo vagarosamente a língua até a boca dele, ele retribuindo, até que as duas se prendessem em constantes diálogos... Perdia-se nisso tudo, que nem percebeu que o primeiro já terminara.
                O segundo vinha inquieto, mas cretino. Ela o olhou com os olhos tão inocentes que ele percebeu e quis sentir-se culpado de algo, mas não sabia o quê.
                - Fica de costas vai!
                E ela fechou novamente os olhos e toda a espera voltava a sua mente. Mas o segundo, sujo e mais cretino, dizia-lhe obscenidades que lhe atrapalhou os sonhos. E sentiu um estremecimento que a fez gemer. Ele riu, ela acompanhou sem saber o porquê. Tentava concentrar-se em algo diverso mas uma angústia de tempo e prazer e não acreditava na vida real e era tudo como antes e uma angústia de gozo cerrando os dentes cravando as unhas e sentia escorrer um mel em sua boca uma angústia maldita e geral feia ou alegre prendendo o grito e o hálito quente... ah! Quase chorou, mas desfeita a farsa, calou na alma o prazer.
                E chegou a vez dele. Tão meigos os seus olhos que ela nem desconfiou. Os olhos concentravam-se profundamente. E ela procurava o beijo, e ele escapava. Ela avançava a boca, ele virava o rosto, tentou segurar-lhe o queixo, ele baixou a cabeça. E tentava salvar a espera como um soldado com esperanças na vitória, e cada movimento dele era uma estocada, um tiro queimando, a boca escondia-se, o rosto opunha-se ao dela, ela avançava os lábios, ele olhava pro céu, e tentava e tentava desesperadamente e nenhuma resposta aos seus abalos. E ele firme, ereto, sem entradas, estúpido, e a coitada já não sonhava mais, tentava realizar tudo, mas tudo fugia das mãos, tão próximo, só para ferir intensamente. Até que seus lábios encontraram-se. Ele arfando em pleno gozo, esqueceu a boca como esqueceu quem ela era. E ela timidamente tentou um movimento. Antes que ele respondesse... ela abriu tristemente os olhos...




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